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segunda-feira, 15 de julho de 2013

PRÍNCIPE, AOS 70 ANOS!



Trabalho com Literatura Infantil e Juvenil e certamente por isso, fui convidada a emitir minha opinião sobre o livro ‘Pequeno Príncipe’ para um jornal de grande circulação em Salvador. Ao fazer isto histórias vieram a minha memória rapidamente. A primeira é que esta leitura se fez para mim na adolescência e eu adorei tê-la lido. Depois, o livro virou de Miss e ficou sendo tratado como piegas, a ponto da pesquisadora Marisa Lajolo, em palestra, ter afirmado que ao ser vista num aeroporto com o livro em mãos, justificou-se para os colegas acadêmicos desconcertada. Um amigo presenteou uma namorada com a obra e ela se zangou com ele, afirmando que o presente significava que ele a achava infantil. Pode?
Quanta bobagem. Tudo preconceito. Ou talvez sejam os ódios academicistas a tudo o que vende bastante. O Pequeno Príncipe é um lindo texto. Ele é explicitamente dirigido às crianças, entretanto possui um amplo teor filosófico. O livro trata de questões existencialistas mesmo. Até porque as crianças – dada a sua forma de ver o mundo com olhos de primeira vez – são bastante afeitas a pensar sobre a vida, o universo e seus mistérios. Com uma linguagem acessível e que trata de um tema universal, o livro, desde sua publicação, caiu no gosto de um vasto público, incluindo as crianças, os adultos, as escolas e até as misses.
A narrativa, para mim, é uma história de formação e aprendizagem, pois o príncipe que vive solitário em seu planeta (acompanhado de uma flor para lá de exigente), sairá dele, visitará outros planetas e de cada lugar sairá impregnado por um conhecimento novo. Ao final, compreenderá que sua maior aprendizagem é o amor fraterno ou a amizade. Daí, nós leitores já embevecidos com a narrativa também aprendemos e repetimos a esmo a célebre frase central da história: “torna-se responsável por aquele que cativas”. A amizade é uma via de mão dupla, pois tanto vincula o outro a nós quanto vincula este nós ao outro.
Para muitos, psicólogos e educadores, este é o percurso de todo ser, ao sair de uma experiência infantil, centrada em si mesmo e acreditando que o universo que o cerca é o mais pleno e importante para ingressar num universo do amadurecimento que nos conduz a uma vida adulta em que cortamos os nossos cordões umbilicais para sair da realidade conhecida e passamos a adentrar contextos diversas dos nossos e com eles aprender. Neste percurso, nos lançamos infinitamente ao crescimento e a aprendizagem, mas sempre amarrados pelos laços-vínculos a tudo que nos cativou em nossa trajetória.
Ah, e o vigor deste texto é tão largo que ele se ressignificou ao longo do tempo, porque eu, por exemplo, que tenho 36 anos, o li na adolescência por indicação da minha mãe, assisti ao filme depois e hoje sou surpreendida com meus sobrinhos, vendo a desenhos animados a partir deste texto. Vejo suas frases em face book, nas papelarias há inúmeros cadernos e papéis de cartas com imagens e frases do livro. Assim, o que garante a importância da obra não é apenas a crítica literária, realizada academicamente, mas é, sobretudo, a sua leitura feita por leitores de todas as idades, em diversos tempos.
É difícil saber por que o livro conquista tantos leitores, extrapolando a alcunha de livro infanto-juvenil. Até porque se soubesse mesmo responder esta pergunta, correria para escrever um livro nestes moldes. Mas posso inferir que muitos livros, rotulados assim conseguem tal qual o Pequeno Príncipe, conquistar leitores de diversas idades, tempos e lugares, por tratarem de temas aparentemente infantis, mas que na verdade são temas universais, ligados a nossa existência e provocadores de questionamentos profundos. Outro ponto é que dada a diversidade de metáforas e imagens, presentes no livro, este suscita uma diversidade de interpretações, leituras e análise – o que faz com que o dialogo com a obra se torne praticamente inesgotável. Também considero encantador no livro o fato do texto desconfiar muitas vezes das certezas do mundo adulto, nos comovendo, sobretudo, porque trata do que é humano.
Não gosto quando dizem que o ‘Pequeno Príncipe’ é livro de miss. Nunca assisti a estes concursos, mas é óbvio que ouvi algumas pessoas, especialmente aquelas que se dizem entendidas em “alta literatura” referirem-se jocosamente ao Pequeno Príncipe assim. Na minha leitura, esta fala tem a clara intenção de desqualificar o texto. Eu acho uma bobagem. Certamente, as misses – educadas a vestirem o disfarce de boas moças de família – faziam referências sinceras a obras, por duas razões (ambas questionáveis para mim). Primeiro pelo texto ser considerado fácil de ler. Portanto, provavelmente por uma associação falaciosa de que a mulher bonita geralmente é intelectualmente incipiente, se faz este tipo de declaração. A segunda é que ler um texto que fale de amizade, numa perspectiva mais subjetiva e romântica do que realista, auxilia na configuração da miss com uma moça de bons princípios e adequada aos preceitos da família burguesa. Eu obviamente discordo dessa redução. Penso que uma obra que é a segunda mais publicada no mundo e é lida por leitores de idades, tempos e lugares diversos, não pode ser pensada somente por vieses tão reducionistas.
Assim, parafraseando Ítalo Calvino (1993), o ‘Pequeno Príncipe’ é um clássico, porque há sempre leitores o lendo ou relendo; porque quem o lê ou quem já o leu geralmente afirma ter aprendido muitas coisas e muito o amado; porque acabou fazendo parte do inconsciente coletivo; porque sempre se fazem novas descobertas ao relê-lo; porque “nunca terminou de dizer aquilo que tinha para dizer”; porque quando nós o lemos pela primeira vez está impregnado de leituras outras... E para mim, principalmente, porque 70 anos depois de sua primeira publicação, ainda existe gente falando sobre ele e mais importante do que isso, LENDO-O!

Um comentário:

  1. Fiquei sabendo deste blog ontem e observei que vivo num mundo pequeno mesmo assim ainda me perco.
    Conheci a Sa. Onilia que foi ou talvez seja se ainda viva se estiver, amiga de Sancy minha mãe. É dito por lendas e prosas que ela foi o grande amor de um aviador e escritor que ficou sumido por um bom tempo e nas suas biografias fica a lacuna de onde andou depois reapareceu sorridente e feliz com uma estoria ou historia, ai vai de quem ler. Bem o tal era Antoine de Saint-Exupéry e o local era o Sapinho na Baia de Camamu.
    Beijos minha mana querida !!

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