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terça-feira, 5 de abril de 2011

SOU UMA FILHA DA MÃE!


Sou uma FILHA DA MÃE!  O que é melhor ou pior: de uma mãe nascida e criada no século XX. 

Sou filha da mãe que nos seus primeiros anos de vida social, foi formada para acreditar no seu enorme potencial para criar filhos e cuidar da casa, mas que logo depois, mais ou menos na época em que saiu da escola pronta fazer o que se esperava dela, viu mulheres queimando sutien, pílula anticoncepcional, trabalho fora de casa, discussão da virgindade, separação de casais, emancipação feminina... E não foi mais a mesma.

Sou filha da mãe que teve que trilhar não um, mas dois caminhos. O pior: dois caminhos que pareciam antagônicos! Sou filha da mãe que se uniu a um homem, por sua própria escolha e risco, teve filhos, trocou fraldas e chupou catarro dos narizes gripados, foi às festinhas escolares, colocou botões em roupas, costurou calças e meias rotas.

Sou filha da mãe que trabalhou na rua, trouxe dinheiro para casa e não aceitou esta história de provedor do lar. Foi ela mesma que pagou suas contas e comprou o esmalte e a comida diária.

Sou filha da mãe que chegava esbaforida às festinhas escolares e às aulas públicas de ballet, que suava para conciliar trabalho e família, que sempre trazia balas e presentes nos dias em que passava inteirinho trabalhando fora de casa. Essa mãe sabia que era dura a espera, era triste a saudade, mas era linda e festiva a ansiedade dos dez minutos antes da sua chegada, a surpresa e a certeza do presentinho e a hora do abraço certo, do afago amigo e do regaço quente mais fraterno que materno. Mais certo ainda era o orgulho dos filhos pela mãe exemplo de luta e coragem.

Sou filha da mãe que, quando eu, aos prantos, descobria com o corpo e o coração sangrando, que acabou a infância, ligou entusiasmada e transcedental para mãe, irmãs, parentes e afins comemorando o ciclo inevitável da vida.

Sou filha da mãe que chorou quando eu lhe contei que os meus eram novos tempos, em que diziam que o sonho havia acabado e a História também, portanto eu tinha pouco ou nada a fazer e me sentia sem norte e sem lugar.

Sou filha da mãe que se desesperou e pensou ter fracassado quando lhe contei da minha ida para a terapeuta e não se preocupasse que eu mesma pagaria a conta.

Sou filha da mãe que comemorou mais a formatura do que o casamento, me contou toda a sua trajetória e me disse que apesar de tanta angústia e correria, não tinha se arrependido de suas escolhas. 

Sou filha da mãe que me ensinou didaticamente, inclusive teorizou e desenhou em quadro negro e me mostrou fórmulas e artigos científicos que declaravam que no meu tempo não haveria mais angústias, estava comprovado cientificamente, a liberdade feminina é um fato e só eu mesma poderia conquista-la para mim e isto era tão ou mais importante que qualquer outra coisa. 

Sou filha da mãe que disse que eu tivesse logo um filho enquanto ela ainda conseguia se abaixar e tinha forças nos braços para carregar e beliscar; me confessou quase telepaticamente que estava doida para ver como seria a sua história no futuro, no tempo em que ela já não estaria mais aqui. Na certa, ela já está no tempo em que se descobre que a história dela mesma não se acaba enquanto eu, minha irmã e nossos filhos e os filhos dos nossos filhos existirem.

Sou a filha que agora chora por descobrir-se filha da mãe. Sou filha, sou a mãe, somos espelhos uma da outra, mesmo que, às vezes, os nossos reflexos sejam turvos, opacos, nítidos ou quase inexistentes. S ou a filha, sou a mãe. Sou a história da mãe, sou a história da avó e de tantas outras mulheres, sou o começo sem final: SOU UMA FILHA DA MÃE!

2 comentários:

  1. É com felicidade que digo a todos no mundo inteiro.: Sou feita do mesmo barro, sou filha da mesma mãe! E por isso sou muitooooooooo FELIZ!
    Lindo texto!
    Bjs,
    Zau.

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  2. Nossa que texto lindo. Vocês da família Sacramento Moreno são maravilhosas, lindas e talentosas. São inspiração! ! Beijo

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